TRT da 3ª Região reconhece vínculo de emprego de menina de 12 anos ‘contratada’ para ser babá

Apesar de ser um crime, o trabalho infantil doméstico é uma prática social que ainda persiste no Brasil. Em 10 de abril último, o julgamento no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) do caso de uma adolescente de 12 anos que foi levada da casa dos pais, em Araçuaí, no norte de Minas Gerais, para ser babá na cidade de Salgueiro, em Pernambuco, colocou novamente esse tema em discussão. 

Na decisão, a Oitava Turma do TRT 3 reconheceu, por unanimidade, o vínculo de emprego entre as partes e determinou o pagamento de indenização no valor de R$ 10 mil como forma de reparação pelos danos morais. 

Contratação 

A história da adolescente teve início em 2011. Ela foi contratada por um casal do município de Salgueiro para ser cuidadora das duas filhas. Na época, uma estava com sete anos e a outra com um ano de idade. A adolescente morou na casa da família pelo período de dois anos, exercendo a função de babá das duas menores, principalmente no período da tarde, já que de manhã frequentava escola pública. 

Os réus negaram a prestação de serviço. Segundo eles, a menina era tratada como filha. No processo, sustentaram que ela foi para Salgueiro para ficar brincando com as crianças e também porque precisava de ajuda, já que era muito pobre e tinha vários irmãos vivendo em estado de extrema miséria. 

Emprego 

Mas, para o juiz convocado da 8ª Turma, Antônio Carlos Rodrigues Filho, relator no processo, a relação de emprego entre eles ficou muito evidente. Segundo o magistrado, a tese da defesa é absurda. “A distância entre as duas cidades é de 1.197 km. Não dá para acreditar que eles levariam uma pessoa estranha, sem laços de parentesco, residente em Araçuaí, para morar na sua casa somente para brincar com suas filhas”, pontuou o juiz. 

Na interpretação do magistrado, nem mesmo o argumento de que a adolescente era tratada como filha ficou comprovado. “Ela estudava em colégio público estadual, enquanto as filhas, em colégio particular”, ressaltou. 

Problema social 

Para o juiz, casos como o da menina de Araçuaí são comuns no Brasil, apesar de o trabalho infantil doméstico constar na lista das Piores Formas de Trabalho Infantil, conforme o Decreto 6.481/2008, que regulamentou pontos da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). 

Segundo observou o relator, é fato notório que, em certas regiões pobres do país, meninas em condições de extrema pobreza são levadas por outras famílias para trabalhar como domésticas, babás e até mesmo na agricultura. “A falta de escolaridade das mães colabora para a existência de trabalho infantil porquanto uma mãe prefere entregar sua filha para trabalhar em casa de terceiros a vê-la passar por necessidades. Infelizmente, é a dura realidade”, lamentou. 

O magistrado explicou que o trabalho infantil doméstico é fortemente enraizado nas práticas sociais do Brasil e se confunde com forma de solidariedade e de relacionamento familiar em lares brasileiros. “As crianças e adolescentes em atividades domésticas são trabalhadores invisíveis, pois seu trabalho é realizado no interior de casas, que não são as suas, sem nenhum sistema de controle e longe de suas famílias”, ponderou. 

Futuro 

Na visão do relator, o trabalho infantil rouba a infância das crianças, impede o acesso e o bom desempenho nas escolas, principalmente para aquelas que moram na casa dos patrões. Segundo ele, essa prática ilegal ainda priva as crianças das brincadeiras com outras pessoas de sua idade, comprometendo sua formação. 

No caso de Araçuaí, o juiz convocado considerou a conduta do casal de Pernambuco como um gravíssimo ato ilícito e, por isso, determinou o pagamento de indenização por danos morais, fixada em R$ 10 mil. Com o reconhecimento do vínculo doméstico, o casal terá que pagar as verbas correlatas, com base em um salário mínimo, pelo período de serviço prestado, além das parcelas relativas à rescisão indireta do contrato.

Fonte: AASP