Papéis trocados: um caso de adoção

Decisão na Comarca de Caçapava do Sul deu sinal verde, na semana passada (28/11), para pedido de adoção formulado por casal, permitindo que uma das parceiras se torne mãe adotiva de uma menina, sua irmã de sangue. A mãe biológica das duas, por sua vez, assume agora o papel jurídico de avó da criança.

A solução é um passo a mais na trajetória das mulheres envolvidas nessa história, que poderia não ter acontecido. Durante a gravidez, sem saber quem seria o pai, nem ter condições econômicas, a gestante cogitou o aborto. O abalo com a notícia e o desejo de ter um filho motivou o casal homoafetivo a assumir as responsabilidades com o bebê.

Interesse maior

Passados quase cinco anos, o Juiz de Direito Diego Carvalho Locatelli não encontrou obstáculo para a concretização da adoção. “Forçoso reconhecer que o caso em apreço, por suas especificidades, justifica-se excepcionar a vedação do art. 42 §1º, do ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]”, escreveu o magistrado em alusão ao artigo que proíbe que ascendentes ou irmãos adotem.

Acrescentou que a “literalidade da lei” levaria a uma imediata improcedência do pedido. No entanto, entende que “a legislação protetiva há de ser norteada pelo princípio do melhor interesse da criança e do adolescente”.

Na sentença, o julgador menciona as provas dos autos, testemunhos (professores, médico pediatra), laudos de especialistas confirmando a existência “dos vínculos maternais” e a plena condição socioemocional do casal, em união estável há sete anos.

“É tranquilo dizer que foram elas que deram vida à criança”, afirmou Locatelli. “E, nos anos seguintes, elas continuaram dando a vida à menina, pois ser pai ou mãe não se limita a gerar uma criança, vai muito além: é demonstrar e exercer a que, talvez, é a maior prova de amor que um ser humano pode realizar, notadamente transmitir amor, carinho e padrões morais ao filho”.

Para ele, o papel do Direito é de limitador ao arbítrio do Estado.

“A nós, investidos do poder estatal, cabe somente respeitar, reconhecer e dar proteção jurídica a este núcleo familiar”, refletiu. “Afinal, se a criança, de maneira profunda e sincera, chama e identifica as autoras como mães, quem somos nós para dizer o contrário? Nenhuma lei ou autoridade é capaz de se sobrepor ao afeto, ainda mais aos sentimentos de uma criança e ao amor maternal”.

Fonte: TJRS